100 vezes Vingt-un – A Saga 21 – Por Elder Heronildes

O HOMEM E AS SUAS AÇÕES – A Obra Eterniza o Homem

 

“Um dia, não me lembro quando, tive a audácia de falar sobre o  meu Mestre e amigo Vingt-un Rosado, e suas obras. Disse então ali, as palavras que se sequem, sem nenhuma modificação de lugar, motivações, efeitos, tempo , espaço e datas. Talvez com elementos desatualizados. Contudo, não quis modificá-los, pois o que pensava, continuo pensando hoje, e com maior intensidade, depois de sua ausência. A caminhada histórica de Vingt-ún não me sai do pensamento, ela perdura em mim, como em mim perdura Mossoró, que teve nele um verdadeiro monumento. Talvez alguém queira para arquivo; se assim for, leia e arquive.

Como começaria? Cingir-me ao homem ou cristalizar a obra? Em uma vertente ou na outra, para se ser honesto, demandaria muito tempo, pela grandeza do homem e magnitude da obra. Uma obra no âmbito da cultura, com toda a sua abrangência conceitual, que toma uma dimensão que transcende a medida concreta das grandes realizações, desaguando no universo cosmonal dos feitos que se espraiam em altitude e longitude, fazendo-a partícipe e integrativa do modelo da própria criação, na expressão mais legítima do termo e com todos os seus benéficos efeitos.

Mas não existiria ela, com a grandeza e as dimensões de que se reveste, sem a marcante presença do homem, que na sua singular pluralidade de ativista cultural, ultrapassa os limites caracterizantes da própria natureza humana, pondo em relevo e num crescendo impressionante, não só a inteligência, sensibilidade e uma visão larga para os notáveis empreendimentos, mas a capacidade e competência que têm garantido a execução de tarefas, no difícil campo da cultura, que extrapolam das naturais e costumeiras ações.

São ações típicas do condoreirismo pelos vôos altos que tão bem lhe caracterizam representativos, como queria Capistrano de Abreu, do condor dos Andes, e que sem dúvida poderiam ser alvo dos cânticos poéticos de um Castro Alves, na lembrança inesquecível e que atravessa os tempos, de “O Livro e a América”, poesia bem peculiar ao estilo, assim denominado por aquele, e que este trecho pode muito bem adequá-lo à situação de Mossoró, graças à ação vibrante, trepidante e até impaciente de Vingt-un Rosado. Vejamos:

 

“Por isso na impaciência

Desta sede de saber,

Como as aves do deserto –

As almas buscam beber…

Oh! Bendito o que semeia

Livros… livros à mão cheia…

E manda o povo pensar!

O livro caindo n`alma

É germe que faz a palma,

É chuva que faz o mar”.

Poesia, sempre eterna, bela e enlevante. Verdades puras através dos sentimentos mais profundos,  mais ardentes, mais leves, cantantes e penetrantes, com a suavidade de uma pluma, mesmo sem perder a energia.

Vingt-un disse que nos lajedos de Apodi, transformaram pedra, em poesia de pedra. E aqui, quase que ousaria dizer, que os livros semeados, caindo na alma do povo, não são só germes que faz a palma ou chuva que faz o mar, são verdadeiros poemas épicos, cantando a saga de Mossoró, com toda sua beleza majestática e grandeza histórica. Vingt-un Rosado tem transformado a Coleção Mosssoroense, que ganha notoriedade e que atravessa fronteiras, no mais lindo poema épico de todo um povo. A coleção mossoroense, digo em alto e bom tom, é um verdadeiro poema épico feito por um homem, num legado histórico à  cidade, cujo rio banhava-lhe o coração.

Estou a lembrar, de soslaio, de algumas observações feitas, se não me é engano, em torno da obra de um renomado romancista brasileiro, apontado ali como “mestre de dois mundos” e que ” tinha a capacidade de transpor a fronteira que separa o universo das manifestações temporais”… E quando esse trânsito se realizava, surgia um “símbolo precioso a ser contemplado, uma obra de valor universal e perene,” na transcendentalidade  do heroísmo incomparável.

Poder-se-ia fazer, com absoluta tranqüilidade de consciência, essa transplantação, essa espécie de transição evolutiva, de cunho social e criativo, para o momento vivido em Mossoró, na contextura maior de um processo que vem desde 1948, demonstrativo, inclusive, de estados emotivos e tendo como nascente e presente, as raízes telúricas e o pulsar incessante dos corações. São obras, em seus diferentes níveis e matizes, fruto do amor, traduzidos, numa seqüência digna de ser enfatizada, pela dedicação á terra e aos livros, fazendo uma simbiose entre o livro e a alma; a alma e o livro, a ponto de não se saber o começo nem o fim de ambos, pois um era o outro invertido.

Os livros, sempre os livros, a ser corda motriz, a ser elemento propulsor e impulsionador das ações mais eloquentes e grandiosas, como produção do saber em seus diversificados campos de atividades intelectuais. Não se chegaria, naturalmente, a dizer como Guimarães Rosa, que: “às vezes, quase sempre, o livro é maior que a gente.”

Cairia, aqui, no maniqueísmo acentuado no início: as obras e o homem. Volver-se-ia aquele ponto interrogativo: a grandeza do homem e a magnitude das obras por ele instrumentalizadas e tornadas realidades. Às vezes o homem cria e na criação supera-se a si próprio, tal a grandeza, nobreza e magnitude da criação, em beleza, em harmonia e em estética., com seu elevado sentido de verdadeira odisseia que, como Ulisses, não se cansa de abrir veredas e fazer caminhos, como se iluminado fosse, criando a infinitividade  no finito.

E quando isso é feito com amor ela se torna mais rica, mais exuberante e mais contagiante, envolvendo todo um povo, projetando-o no tempo e no espaço existencial, como o de nossa terra.

Diante disso, não seria um despropósito, digo-o eu, trazer para cá, um pequeno trecho de Guimarães Rosado, que dá bem o sentido do que tem sido feito, desde 48 com Dix-Sept e de lá para cá, com Vingt-un Rosado:

“Só o amor em linhas gerais infunde simpatia e sentido à história,”  mesmo que pareça impossível e irreal ao ser humano.

E a história em Mossoró, sempre tem sido feita com amor e emotivamente. E por entre esses ardentes sentimentos de amor à terra e aos livros, tem se plasmado, ganhando notoriedade, respeito e consagração, a Coleção Mossoroense, que atinge mais uma etapa de sua laboriosa,  profícua e produtiva existência, atingindo 3.680 títulos, dos quais 1.290 livros. E com ela o seu inspirador, criador e artífice maior, professor Vingt-um Rosado.

Pode-se dividi-la em 3 momentos. O primeiro, na órbita da Prefeitura de Mossoró – 1949 a 1973, com duração de 25 anos, com a edição de 293 títulos; o segundo na ESAM – Fundação Guimarães Duque, de 1974 a 1994, num período de 21 anos, com 1888 títulos editados e o  terceiro, sob o manto da Fundação Vingt-un Rosado, de abril de 1995 até setembro de 2002, com duração de 7 anos e 05 meses. Neste período foram publicados 1454 títulos.

E hoje será, sem dúvida, o início de uma nova e grandiosa etapa, que permitirá seja a Coleção Mossoroense, através da Fundação Vingt-un Rosado, enriquecida, por força da aquisição de equipamentos gráficos para a editora, permitindo, além do mais, a publicação de novos títulos.

Isso, graças ao apoio de grande significação e importância, da Petrobrás, que vai investir cerca de 100 mil reais, na mantenedora da Coleção Mossoroense, para a execução do projeto Rota Batida, dentro de um convênio contemplado pela Lei Câmara Cascudo.

No momento em que uma empresa do porte e da grandeza da Petrobrás se sensibiliza com o programa de editoração da Fundação Vingt-un Rosado, e põe em relevo os seus motivos, entre os quais, a abrangência e a elasticidade da sua programação, sem dúvida a maior do país em publicação, enchem de orgulho a todos nós, mossoroenses.

Simplesmente, porque a abrangência da publicação dos livros, sempre a considerei, e continuo, como um ponto positivo e louvável, por incentivar, estimular e permitir que autores novos, quaisquer que sejam os gêneros literários adotados, pudessem publicar os seus trabalhos. Seria incompreensível e sem sentido, se tivesse ela, a editora, se enfurnado entre quatro paredes e restringisse suas atividades, limitando o número das publicações, através de seleções discriminatórias de gêneros literários e autores.

Sinto-me profundamente entusiasmado, e como mossoroense, alegre, satisfeito e com muita gratidão pelo gesto de grandeza, de nobreza e profunda sensibilidade dos dirigentes da Petrobrás, pelo reconhecimento público ao abnegado (como um verdadeiro sacerdócio) trabalho exercitado pelo nosso Mecenas, que tanto orgulho nos tem proporcionado.

Gosto de repetir sempre: O mérito de um homem repousa em sua sabedoria e em suas ações. E o professor Vingt-un Rosado o tem feito com elevação de espírito e coragem.

Esperamos que a cultura, disseminada pela Coleção Mossoroense, possa fazer os homens mais livres. (UT LIBRE LIBEROS LIBERENT)

 

Elder Heronildes da Silva – Presidente da Academia Mossoroense de Letras